—Deves estar a brincar —disse Leonor, olhando para Eduardo Carvalho com os olhos muito abertos.
Ele abanou a cabeça:
—Não, não estou a brincar. Mas dou-te tempo para pensares. Porque a proposta não é nada comum. Até suspeito do que estás a pensar agora. Pensa bem, medita… volto dentro de uma semana.
Leonor ficou a observá-lo, perplexa. As palavras que ele dissera não faziam sentido na sua cabeça.
Conhecia Eduardo Carvalho há três anos. Ele era dono de uma cadeia de bombas de gasolina e outros negócios. E naquela bomba, Leonor trabalhava como empregada de limpeza. Sempre cumprimentava toda a gente com simpatia e falava com cordialidade. No fundo, era um homem bom.
O salário na bomba era decente, e havia muita gente interessada em trabalhar ali. Há uns dois meses, depois de limpar, Leonor estava sentada no exterior: o turno estava quase a acabar e faltavam uns momentos até ao fim.
De repente, a porta dos funcionários abriu-se, e lá estava Eduardo Carvalho.
—Posso sentar-me ao teu lado?
Leonor levantou-se num pulo:
—Claro! Porquê essa pergunta?
—E porquê esse susto? Senta-te, eu não mordo. Hoje está um belo dia.
Ela sorriu e sentou-se novamente.
—Sim, na primavera parece que sempre faz bom tempo.
—É porque todos já estamos fartos do inverno.
—Talvez tenha razão.
—Sempre tive curiosidade: por que trabalhas como empregada de limpeza? A Andreia tinha-te oferecido passar para operadora. Melhor salário, trabalho mais leve.
—Eu adoraria, mas não posso por causa do horário —a minha filha é pequena e adoece com frequência. Tudo bem quando a vizinha a pode cuidar, mas quando há surtos, tenho de estar por perto. Por isso, a Andreia e eu revezamo-nos quando é preciso. Ela ajuda sempre.
—Entendo… E o que se passa com a menina?
—Ah, nem pergunte… Os médicos nem sequer conseguem explicar direito. Ela tem ataques, fica sem respirar, entra em pânico, muitas coisas. E os exames são caros e complicados. Dizem que temos de esperar, que talvez passe com a idade. Mas eu não consigo esperar…
—Bem, aguenta. Tudo vai correr bem.
Leonor agradeceu. E nessa noite soube que Eduardo Carvalho lhe tinha dado um bónus —sem explicações, simplesmente entregou-lho.
Depois disso, não o voltou a ver. Até que, hoje, apareceu de repente em sua casa.
Quando Leonor o viu, o coração quase parou. E quando ouviu a proposta, sentiu-se ainda pior.
Eduardo tinha um filho: Vasco, quase com trinta anos. Sete desses anos passara-os numa cadeira de rodas, depois de um acidente. Os médicos fizeram tudo, mas ele nunca mais conseguiu andar. Depressão, isolamento, quase nenhuma comunicação —nem sequer com o pai.
Foi então que Eduardo teve a ideia: casar o filho. Mesmo. Para que ele tivesse um propósito, vontade de viver, de lutar. Não tinha a certeza se funcionaria, mas decidiu tentar. E achou que Leonor era a pessoa ideal para esse papel.
—Leonor, viverás sem preocupações. Terás tudo. A tua filha fará todos os exames e receberá o tratamento. Proponho um contrato de um ano. No fim desse ano, vais-te embora, aconteça o que acontecer. Se o Vasco melhorar, bem. Se não, serás generosamente recompensada.
Leonor não conseguia falar: a indignação invadia-a.
Eduardo, como se lesse os seus pensamentos, disse baixinho:
—Leonor, peço-te, ajuda-me. Isto é bom para os dois. Nem sequer sei se o meu filho se irá aproximar de ti. Mas para ti será mais fácil: estarás numa posição respeitável, legalmente casada. Imagina que te casas não por amor, mas por circunstâncias. Só te peço uma coisa: desta conversa, não digas nada a ninguém.
—Espere, Eduardo… E o seu Vasco? Ele concorda?
O homem sorriu com tristeza:
—Diz que lhe é indiferente. Eu vou dizer que tenho problemas —com os negócios, com a saúde… O importante é que ele fique casado. De verdade. Ele sempre confiou em mim. Por isso… isto é uma mentira para o bem.
Eduardo foi-se embora, e Leonor ficou sentada, paralisada. Por dentro, fervia de indignação. Mas as suas palavras diretas e sinceras suavizaram um pouco a aspereza da proposta.
E se pensasse bem… O que não faria por Mariana?
Tudo.
E ele? Também era pai. Também amava o filho.
Ainda não tinha terminado o turno quando o telefone tocou:
—Leonor, vem já! A Mariana está com um ataque! Muito forte!
—Vou a caminho! Chamem a ambulância!
Chegou a tempo de ver a ambulância estacionar à porta.
—Onde estava, mãe? —perguntou o médico com severidade.
—Estava a trabalhar…
O ataque era mesmo grave.
—Talvez para o hospital? —perguntou Leonor timidamente.
O médico, que era novo, abanou a mão, exausto:
—Para quê? Lá não a vão ajudar. Só farão piorar o estado nervoso da menina. Oxalá pudessem ir para Lisboa —para uma boa clínica, com especialistas a sério.
Passados quarenta minutos, os médicos foram-se embora.
Leonor tomou o telefone e ligou a Eduardo:
—Aceito. A Mariana teve outro ataque.
No dia seguinte, partiram.
Eduardo veio pessoalmente, acompanhado por um jovem bem barbeado.
—Leonor, leva só o essencial. O resto compramos.
Ela anuiu.
Mariana olhava com curiosidade para o carro —grande e reluzente.
Eduardo agachou-se à sua frente:
—Gostas?
—Muito!
—Queres ir à frente? Assim vês tudo.
—Pode ser? Quero muito!
A menina olhou para a mãe.
—Se os polícias nos virem, multam —disse Leonor com severidade.
Eduardo riu-se e abriu a porta:
—Entra, Mariana! E se alguém nos quiser multar, nós é que lhes vamos pôr a multa a eles!
À medida que se aproximavam da casa, Leonor ficava mais nervosa.
«Meu Deus, porque é que aceitei? E se ele for estranho, agressivo…?»
Eduardo reparou na sua agitação…
—Leonor, acalma-te. Falta ainda uma semana para o casamento. Podes mudar de ideias a qualquer momento. E além disso… O Vasco é um bom garoto, inteligente, mas lá dentro algo se partiu. Tu mesma vais perceber.
Leonor saiu do carro, ajudou a filha a descer e de repente ficou imóvel, a olhar para a casa. Não era apenas uma casa: era um verdadeiro palácio. E Mariana, sem se conter, gritou com alegria:
—Mãe, agora vamos viver como num conto de fadas!
Eduardo soltou uma gargalhada, pegou na menina ao colo:
—Gostas?
—Muito!
Até ao casamento, Leonor e Vasco apenas se viram um par de vezes, em jantares. O rapaz quase não comia, quase não falava. Estava ali, sentado à mesa, como se o corpo ali estivesse mas a mente noutro lugar. Leonor observava-o com cautela. Fisicamente, era atraente, mas pálido, como se não visse o sol há muito tempo. Sentia que, tal como ela, vivia com dor. E agradeceu-lhe o fato de nunca tocarem no assunto do casamento iminente.
E quando o bebê nasceu, e Vasco deu os primeiros passos sozinho para o segurar, Leonor soube que, mais do que um contrato, mais do que um castelo, mais do que qualquer sonho, tinha encontrado algo raro — uma família verdadeira.