Divorciada, meu marido jogou um travesseiro velho em mim com desdém. Quando abri para lavar, fiquei sem palavras com o que encontrei…

Há muito tempo, eu e o António estávamos casados há cinco anos. Desde o primeiro dia em que me tornei sua esposa, acostumei-me às suas palavras frias e olhares indiferentes. António não era violento nem gritava, mas a sua apatia fazia o meu coração murchar um pouco a cada dia que passava.

Depois do casamento, vivemos na casa dos pais dele, num bairro de Lisboa.

Todas as manhãs, levantava-me cedo para cozinhar, lavar roupa e limpar.

Todas as noites, sentava-me e esperava por ele, só para ouvi-lo dizer:

“Já comi.”

Muitas vezes perguntei-me se aquele casamento era diferente de ser uma inquilina. Tentei construir, tentei amar, mas tudo o que recebi em troca foi um vazio invisível que não conseguia encher.

Um dia, António chegou a casa com um rosto impassível.

Sentou-se à minha frente, entregou-me os papéis do divórcio e disse, com voz seca:

“Assina. Não quero perder mais tempo, nem o teu nem o meu.”

Fiquei paralisada, mas não surpreendida. Com lágrimas nos olhos, peguei na caneta com mão trémula. Todas as memórias de esperar por ele à mesa, das noites em que aguentei dores de barriga sozinha, voltaram de repente como feridas abertas.

Depois de assinar, arrumei as minhas coisas.

Naquela casa, quase nada era meu, apenas algumas roupas e a velha almofada com que sempre dormia.

Quando puxei a mala para sair, António atirou-me a almofada, com uma voz carregada de sarcasmo:

“Leva isso e lava-a. Já está quase a desfazer-se.”

Agarrei a almofada, com o coração apertado. Era mesmo velha; a fronha estava desbotada, com manchas amareladas e rasgões.

Era a almofada que trouxera da casa da minha mãe, de uma pequena aldeia no Alentejo, quando fui estudar para a cidade, e mantive-a depois de me casar porque sem ela tinha dificuldade em adormecer.

Ele queixava-se dela, mas eu nunca a deixei. Saí daquela casa em silêncio.

De volta ao meu quarto alugado, sentei-me atordoada, a olhar para a almofada. Lembrei-me das suas palavras e decidi tirar a fronha para a lavar, pelo menos para dormir com ela limpa, longe das recordações dolorosas.

Quando abri o fecho, senti algo estranho. Havia algo duro no meio do enchimento. Meti a mão e parei, gelada. Um pequeno embrulho, cuidadosamente envolto num saco de plástico.

Abri-o com mãos trémulas. Dentro estava um maço de notas, todas de 50 euros, e um papel dobrado em quatro.

Desdobrei-o. Reconheci logo a letra da minha mãe, trémula e hesitante:

“Minha filha, este é o dinheiro que juntei para ti, caso passes por dificuldades. Escondi-o na almofada porque temia que fosses demasiado orgulhosa para o aceitar. Não sofras por um homem, querida. Eu amo-te.”

As lágrimas caíram pesadas sobre o papel amarelecido. Lembrei-me do dia do casamento, quando a minha mãe me entregou a almofada, dizendo que era muito macia, para eu dormir bem.

Eu ri-me e respondi:

“Estás a ficar velha, mãe, que ideia tão esquisita. O António e eu vamos ser felizes.”

Ela apenas sorriu, com um olhar distante e triste. Apertei a almofada contra o peito, como se fosse o abraço da minha mãe, a acariciar o meu cabelo.

Afinal, ela sempre soube quanto uma filha sofreria se escolhesse o homem errado. Afinal, preparara-me um plano, não de riqueza, mas de esperança.

Naquela noite, deitei-me na cama dura do meu quarto alugado, abraçada à almofada, com as lágrimas a molharem a fronha.

Mas desta vez, não chorava por causa do António. Chorava porque amava a minha mãe.

Chorava porque me sentia sortuda, por ainda ter um lugar para onde voltar, uma mãe que me amava e um mundo enorme à minha espera.

Na manhã seguinte, acordei cedo, dobrei a almofada com cuidado e guardei-a na mala. Decidi que arranjaria um quarto mais pequeno, perto do trabalho.

Enviaria mais dinheiro à minha mãe e viveria uma vida em que não precisasse de tremer ou esperar por uma mensagem fria de ninguém.

Sorri para o meu reflexo no espelho.

Aquela mulher de olhos inchados, a partir daquele dia, viveria por si mesma, pela mãe que envelhecia na sua terra e por todos os sonhos da sua juventude que ainda estavam por cumprir.

Aquele casamento, aquela almofada velha, aquele sorriso sarcástico… tudo não passava do fim de um capítulo triste. Quanto à minha vida, ainda havia muitas páginas por escrever, com as minhas próprias mãos resistentes.

Leave a Comment