**Diário de uma Mãe**
Quando o médico colocou no meu colo dois seres tão pequeninos — um menino e uma menina —, meu coração encheu-se de uma ternura indescritível, misturada com uma dor aguda. A dor não vinha do parto, nem do cansaço, mas da ausência do meu marido. Ele tinha prometido estar ao meu lado naquele dia, jurara que viria, que me apoiaria, que traria flores. Mas quem entrou no quarto foi apenas uma enfermeira, com um tom indiferente:
— O seu marido não veio.
Tentei não chorar, mas algo dentro de mim partiu-se.
Os três dias no hospital pareceram uma eternidade. Eu esperava vê-lo a cada instante, a ouvir os seus passos no corredor. Mas o telefone permanecia em silêncio. Ele não atendia, e quando finalmente consegui falar com ele, respondeu apenas:
— Estou ocupado.
Ocupado… enquanto eu, sua mulher, lhe dava dois filhos de uma só vez.
A alta foi uma prova difícil. As outras mulheres saíam de braço dado com os maridos, rodeadas de família, balões, flores, risos e fotografias. Eu saí sozinha, com dois fardos nos braços e um nó na garganta.
— Táxi para a Rua das Oliveiras, número oito — pedi, ajustando o meu filho e apertando minha filha contra o peito.
O motorista olhou-me pelo retrovisor. Duas cabecinhas, um laço cor-de-rosa e outro azul. Dois pares de olhos que ainda nada sabiam da dor e da traição, fitando-me com uma confiança que eu não poderia trair.
— O pai vai recebê-los? — perguntou ele, por fim.
Virei-me para a janela. O que responderia? Que o meu marido me bateu quando estava grávida de oito meses e depois desapareceu? Que nem sequer perguntou por mim ou pelos nossos filhos? Que as únicas flores que recebi no hospital vieram da vizinha do prédio?
A Leonor — assim chamei a minha filha — franziu o narizinho e começou a chorar. O Tomás, seu irmão gémeo, logo se juntou a ela. Balancei-os nos braços e murmurei:
— Calma, meus amores… A mamã está aqui.
Assim começou a minha nova vida.
O táxi parou suavemente à frente do meu prédio. Uma mala, dois bebés e mãos trémulas — era tudo o que tinha naquele momento. Saí com dificuldade, recusando a ajuda do motorista:
— Obrigada, consigo sozinha.
Ele assentiu, mas antes de partir, olhou-me com ternura e disse:
— Força, menina. Agora tem alguém por quem viver.
As palavras dele cortaram como uma faca, porque eu ainda não tinha percebido totalmente: tudo dependia de mim agora.
A subida até ao quarto andar, sem elevador, quase me venceu. A cada patamar, sentia vontade de chorar. Mas os meus filhos resmungavam, e isso dava-me força. Eu sabia que não podia desistir.
O cheiro de abandono invadiu-me ao entrar em casa. Três dias, e ele nem sequer limpara. Pratos sujos, cinzas no parapeito da janela, garrafas de cerveja vazias. Revoltei-me ao lembrar como sonhava em encher aquele apartamento com amor e risos infantis. Agora, parecia um lugar destruído.
Deitei a Leonor e o Tomás nos berços que preparei antes do parto. Eles adormeceram juntos, como se sempre soubessem que pertenciam um ao outro. Sentei-me ao lado e deixei escapar o primeiro choro.
— A mamã está aqui — sussurrei. — Não vos vou deixar, ouvem? Não vos entrego a ninguém.
Naquela noite, quase não dormi. Eles choravam alternadamente, e eu corria de um lado para o outro. Cansava-me, mas a exaustão não importava. O telefone permanecia mudo.
Na manhã seguinte, alguém bateu à porta. Era a Dona Adelaide, a vizinha que me trouxe flores no hospital. Ela trazia uma panela.
— Então, mãe coragem! — disse, com um sorriso que não escondia a preocupação.
Deixei-a entrar, grata.
— Fiz sopa, precisas de comer. Criar dois sozinha não é brincadeira. Onde está o teu marido? — olhou para a sala, com as garrafas vazias.
Apertou-me a garganta.
— Não sei.
Ela suspirou mas não insistiu.
Assim começou a minha luta: noites sem dormir, fraldas, cólicas… mas também a felicidade pura das suas risadas.
—
Passou uma semana. Ele não apareceu. Nenhuma mensagem, nenhum telefonema. Quando ligava, ele ignorava ou respondia com um seco: «Estou ocupado».
Numa noite, quando os pequenos adormeceram, sentei-me à janela e percebi claramente: não havia mais nada para esperar.
Nasceu em mim uma força. A que a vizinha e até o taxista mencionaram. A força de uma mãe.
— Eu consigo — disse em voz alta. — Pela Leonor e pelo Tomás.
E fui conseguindo. Mesmo exausta, mesmo chorando às escondidas, acordava todos os dias sabendo que os meus filhos estavam vivos, saudáveis e a sorrir-me.
Ele continuou ausente. Apagou-nos da sua vida. Ignorou chamadas, nunca mandou dinheiro, apenas um raro “não tenho” por mensagem.
Um dia, na farmácia, faltaram-me dois euros para o remédio das cólicas. Envergonhada, ia desistir quando uma senhora atrás de mim me estendeu a moeda que faltava.
— Tome, mãezinha. Vai ficar tudo bem.
Chorei ali mesmo.
—
Quatro semanas depois, ele veio. Entrou bêbado, ignorou os berços e zombou:
— Então, mãe coragem, como vai isso?
Abracei a Leonor, que chorava, e ouvi-o dizer:
— Nem parecem meus filhos.
Foi pior que um murro.
— Sai daqui — disse, friamente.
Ele bateu a porta, deixando para trás só o cheiro do tabaco barato.
Naquela noite, decidi: seria pai e mãe. A vizinha ajudou-me com documentos, informou-me sobre apoios. O taxista, o Tiago, começou a aparecer mais. Trazia comida, cuidava das crianças quando eu precisava. Um dia, confessou-me:
— Há pais que nunca serão pais de verdade. E há quem o seja sem partilhar sangue.
O meu ex voltou, tentou voltar. Mas o Tiago estava lá, e eu disse-lhe:
— Encontrei a mim mesma e aos meus filhos. E tu já não fazes parte disso.
Hoje, dois anos depois, a Leonor e o Tomás correm, riem. O Tiago lê-lhes histórias, brinca com eles. Para eles, ele é o pai. Para mim, o homem que me fez acreditar que o amor existe.
E quando ele me diz, com um ramo de margaridas nas mãos:
— Vamos para casa, mãe?
Eu sei que, finalmente, temos um lar.