Deficiência e virgindade aos 40: sua vida mudou ao pedir abrigo na tempestade6 min de lectura

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António Mendes tinha quarenta anos e estava convencido de que o amor simplesmente não fazia parte do seu destino.
Vivia sozinho numa casa de madeira no alto da Serra da Estrela, resignado à solidão depois de décadas de humilhação e rejeição.

Nascido com paralisia cerebral, caminhava com uma claudicação, o braço direito tinha pouca força e a fala arrastada fazia com que alguns o achassem estranho. Mas o que mais o marcou não foi o corpo—foi a forma como os outros o trataram por causa dele.

Aos vinte e cinco anos, atreveu-se a convidar uma colega de trabalho, Beatriz, para sair. A resposta dela destruiu-o: “És gentil, António, mas nunca poderia ficar com alguém como tu. O que diriam os outros?” No dia seguinte, ela contou aos colegas, e ele tornou-se alvo de piadas cruéis. Aquela humilhação foi o golpe final. Os pais, embora amorosos, também não ajudaram. O pai dissera-lhe uma vez: “Homens como nós não foram feitos para casar. Foca-te no trabalho.”

Então, António fugiu.
Usou as poupanças para comprar uma casa isolada, onde ninguém pudesse ter pena dele ou gozar. Durante oito anos, viveu numa rotina rígida: acordar às seis, beber café preto, alimentar os seus três cães resgatados—Zé, cego; Estrela, de três patas; e Pipa, surda—e passar horas a programar como freelancer. Sem ninguém para o magoar, julgava-se seguro. Mas também estava profundamente só.

Naquele novembro, enquanto uma tempestade violenta sacudia a serra, ouviu-se uma batida à porta. António gelou. Visitas eram raras, e ele evitava desconhecidos há anos. Pela janela, viu uma jovem encharcada, a tremer de frio. Tudo nele pedia para ficar calado, mas a compaixão falou mais alto. Abriu a porta.

“Menina, está tudo bem?”, perguntou, a voz instável.

A mulher—Eva Lopes, fotógrafa de trinta e quatro anos—pediu desculpa, ofegante. O carro avariara, o GPS falhara, e ela caminhara horas sob a tempestade. António quis entregar-lhe um telefone e mandá-la embora, mas o temporal tornava isso impossível. “Entre”, disse, relutante. “Não pode ficar aí fora.”

Eva entrou, deixando pingar água no chão.
Os cães rodearam-na imediatamente, Estrela a encostar-se a ela como se sentisse confiança. António deu-lhe toalhas, ofereceu chá e explicou que não havia sinal de telemóvel até a tempestade passar. Eva, ainda a tremer mas sorrindo grata, apresentou-se. Ele notou como ela olhava nos seus olhos sem hesitar. Não se importava com a claudicação ou o braço fraco. Pela primeira vez em anos, alguém lhe falava sem julgamento.

Naquela noite, Eva dormiu no quarto de hóspedes enquanto a tempestade rugia. António ficou acordado, perturbado por um calor estranho que lhe aquecia o peito. Será que alguém pudera mesmo vê-lo para além da deficiência?

Na manhã seguinte, preparou o pequeno-almoço nervoso. Quando Eva se juntou a ele, a simplicidade doméstica de partilhar café parecia quase irreal. Ela perguntou sobre a vida dele na serra, genuinamente curiosa. Hesitante, António admitiu que evitava as pessoas porque “podem ser cruéis, especialmente com quem é diferente.”

“Diferente como?”, perguntou ela.

“Tenho paralisia cerebral,” disse secamente.
“Manquejo, falo devagar. Não sou o que as pessoas consideram desejável.”

Eva olhou-o nos olhos. “Isso é um absurdo. António, nestas doze horas, deste-me abrigo, calor e bondade. Se os outros não veem o teu valor, a perda é deles, não tua.”

As palavras atravessaram-no. Pela primeira vez em décadas, sentiu a possibilidade de ser valorizado.

Quando foram ver o carro mais tarde, não pegou. As estradas estavam bloqueadas. Eva perguntou se podia ficar mais uns dias. O coração de António saltou. “Claro,” disse, tentando soar calmo.

Aqueles dias transformaram o seu mundo. Cozinharam juntos, partilharam histórias e passearam pela propriedade com os cães. Eva fotografava a natureza, mas António reparou que, por vezes, a câmara se virava para ele. Pela primeira vez em oito anos, sentiu-se não invisível, mas visto.

Numa tarde ao pôr do sol, Eva perguntou suavemente: “António, já foste casado?”

Ele gelou, depois confessou num murmúrio: “Nunca estive com ninguém. Nunca beijei uma mulher. Aos quarenta, ainda sou virgem. As mulheres vêem-me como amigo, nunca mais.”

O peito de Eva se apertou de pena e admiração. Aproximou-se. “Foi engano delas. Não viram o homem que eu vejo.”

Antes que ele respondesse, disse as palavras que mudariam tudo: “Porque eu apaixonei-me por ti.”
António fitou-a, estupefacto. “Isso não é possível. És bonita, independente—poderias ter qualquer um.”

“Mas não quero qualquer um,” Eva afirmou. “Quero-te a ti.” Pegou-lhe na mão. “Posso beijar-te?”

Ele anuiu, trémulo. Os lábios dela tocaram os seus com suavidade, depois mais fundo, libertando uma vida inteira de desejo. Lágrimas escorreram-lhe pelo rosto. O primeiro beijo aos quarenta—e foi perfeito.

Por quatro dias, viveram como num sonho. Mas a realidade intrometeu-se quando o mecânico chegou. O carro de Eva ficou pronto. Ela tinha prazos, trabalhos no estrangeiro, uma vida para além da serra. O medo de António regressou como uma sombra.

“Quero que venhas comigo,” Eva disse de repente.
António entrou em pânico. “Não posso. Lá fora, as pessoas vão olhar. Vão rir-se de nós. Vão perguntar o que uma mulher como tu faz comigo.”

“Para,” Eva cortou. “Não és defeituoso. Sabes o que eu vejo? Um homem que construiu uma vida apesar de tudo. Que resgata cães porque entende a rejeição. Que me salvou da tempestade e me fez sentir segura. É esse o homem que amo.” Ajoelhou-se diante dele, lágrimas nos olhos. “Se não consegues acreditar que mereces amor, então acredita em mim quando te digo que sim.”

O mecânico terminou, mas Eva recusou-se a partir sem ele. “Vem comigo, António. Por favor.”

Ele olhou para a casa, para os cães, para a frágil segurança da solidão. Depois para Eva, a mulher que vira através de todos os muros que construíra. “Não posso abandonar os meus cães,” sussurrou.

“Então levamo-los,” Eva disse, chorando. “Para onde eu for, eles vêm também.”

António fechou os olhos, décadas de medo a lutar contra uma coragem recém-descoberta. Por fim, disse: “Está bem. Vou contigo.”

Ela beijou-o com força, selando a decisão.

Duas semanas depois, António estava no aeroporto de Lisboa, sobrecarregado pela multidão depois de anos de reclusão. Os cães esperavam nas transportadoras. Eva apertou-lhe a mão. “Estás bem?”

“É muito,” admitiu, olhando nervoso para os desconhecidos que cochichavam. Os velhosOs seus medos se dissiparam quando Eva lhe sorriu, e ele percebeu que, finalmente, o amor não era uma miragem, mas um porto seguro que ele jamais imaginara poder chamar de seu.

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