«O marido enviou a mãe para o mar. Mas não esperava que eu também partisse. E para longe.»
O Mar e a Escolha
— Inês, as tuas férias estão canceladas — anunciou Eduardo à mesa do jantar, esticando os lábios num sorriso satisfeito. Era evidente que se deleitava com o momento. — Comprei uma viagem para a minha mãe. Ela sempre sonhou conhecer o mar, percebes? Agora vai em teu lugar, para se distrair. Merece.
Inês ergueu lentamente os olhos do prato. Fitou o marido com um olhar longo e ponderado. Nada disse. Apenas sorriu, não com malícia, não com sarcasmo, mas com uma calma perturbadora.
Foi aquele sorriso que deixou Eduardo inquieto. Estava preparado para o escândalo, para os gritos, para os pratos atirados. Mas encontrou apenas silêncio. E aquele sorriso estranho, incompreensível.
— Então… não te importas? — perguntou, já menos seguro. — A sério?
— Claro que não, meu amor — respondeu Inês, suave, continuando a comer como se nada tivesse acontecido. — Se a tua mãe sonhava com o mar, que o seu sonho se realize. Como poderia ser de outra forma?
Eduardo ficou visivelmente desconcertado. De onde vinha aquela serenidade? Teria corrido tudo tão bem? «Afinal, a minha Inês é compreensiva», pensou, aliviado.
Dona Amélia partiu três dias depois. O pacote para o Algarve, um fato de banho novo, a mala cheia e um rosto radiante. Tagarelava sem parar:
— Olha, Inês, este chapéu fica-me tão bem! Pedi emprestado à vizinha Conceição, mas não lho devolvo — que fique com inveja. Eduardo, meu filho, obrigada! És um verdadeiro homem. E tu, Inês, não fiques muito aborrecida. Ainda que… — soltou uma risadinha — talvez te remoa a consciência, sabendo que eu estou a divertir-me e tu fechada neste apartamento.
O humor da sogra era peculiar, mas Inês limitou-se a acenar e sorrir.
Naquela noite, Eduardo bebeu uma cerveja diante da televisão, a ver o jogo de futebol. Sentia-se um herói: fizera a mãe feliz e evitara conflitos em casa. «Esta é a vida adulta», pensou, satisfeito. «Tudo sob controlo.»
Mas então começou.
No dia seguinte, Inês não voltou para casa. O telemóvel não atendia. Eduardo só se preocupou à meia-noite, quando notou que a escova de dentes dela desaparecera. Depois, correu para o armário — metade das roupas sumira. Do toucador sumiram-se os perfumes, os cremes e até o fato de banho novo que ela comprara para as férias.
Como se Inês nunca tivesse existido.
No dia seguinte, chegou a mensagem: «Adeus, Edu. Se não me podes levar ao mar, eu, como mulher que sou, levo-me a mim mesma. Não te preocupes e não bebas muito — sóbrio já és difícil. Inês.»
E abaixo, uma fotografia. Inês diante do mar azul-turquesa, com um chapéu de aba larga, um vestido decotado e um copo na mão. Ao lado, um homem alto, de barba, numa camisa branca. Ambos sorriam, felizes e apaixonados.
Eduardo olhou para o ecrã, incrédulo. Como entender? Fugira com outro? E a casa, o matrimónio, o compromisso?
Três dias mergulhado na bebida. Primeiro cerveja, depois aguardente, no fim algo escuro numa garrafa de plástico — nem lembrava o que comprara. A televisão estava muda. Apenas o miar da gata faminta quebrava o silêncio, pois ela só comia o que roubava da mesa enquanto ele estivera inconsciente.
Inês desaparecera como fumo.
Ao sétimo dia, Dona Amélia regressou — bronzeada, animada, com uns óculos escuros e um íman de um golfinho.
— Filho, cheguei! — exclamou, alegre. — Nem imaginas como foi maravilhoso! O mar, cristalino, a comida, divina. Apesar de ter exagerado nos figos e passado um dia no quarto, mas valeu a pena! A vista era deslumbrante. A propósito, onde está a Inês?
Eduardo estava na poltrona — barbudo, inchado, de cuecas e uma camiseta velha. À frente, uma garrafa vazia e um prato de massa fria.
— A Inês… foi para o mar — respondeu, rouco. — Fugiu com um amante. No segundo dia depois da tua partida, mãe. Enviou mensagem — disse que partiu porque eu não lhe dei o mar. Depois, a foto… Ela e um tipo barbudo, abraçados, a brindar.
Dona Amélia ficou petrificada. Permaneceu em silêncio um instante, depois explodiu:
— Mas o que é isto? Que absurdo! E tu, banana, deixaste a tua mulher fugir? Onde estavas quando ela fazia as malas?
— Bebia.
— Claro! O que eu esperava? Bebias, e ela meteu-se num avião com um qualquer. Nenhum respeito. E tu ficas aqui, como um pato derrotado. Força, levanta-te, vai atrás dela!
— Para quê, mãe? — Eduardo sorriu amargamente. — Ela escreveu «adeus». Não há volta a dar. E agora… — Ela tem tudo: dinheiro, passaporte e, pelo visto, felicidade.
— Ó Eduardo, Eduardo… Que tolo soubeste ser… E eu, uma tonta. — Dona Amélia sentou-se no banco, fitando o chão. — Fui eu que estraguei tudo. Devia ter comprado a viagem para vocês, não para mim.
Passou um mês. Inês não regressou.
PelEduardo olhou para o mar ao longe, enquanto sua mãe chorava em silêncio na cozinha, e percebeu que o mar nunca fora o problema, mas sim o quanto ele deixara de navegar nas próprias escolhas.