**Diário Pessoal**
Com apenas catorze anos, Inês sentou-se no alpendre da casa da família nos subúrbios de Braga, uma mochila gasta aos pés e o telemóvel com 12% de bateria. O vento de novembro cortava-lhe a pele, mas não era o frio que a fazia tremer—era o silêncio por trás da porta trancada.
Duas horas antes, a mãe tinha descoberto o teste de gravidez descartado, enrolado num lenço de papel. O rosto dela perdera a cor ao segurá-lo.
*”Mentiste-me,”* disse a mãe, voz plana e estranha. *”Há quanto tempo?”*
Inês não conseguiu responder de imediato. Nem sequer tinha contado ao Diogo—o rapaz com quem saía em segredo há meses.
*”Oito semanas,”* sussurrou.
A mãe trocou um olhar duro com o padrasto, o Ricardo, que ficara parado no meio da sala. Após uma pausa tensa, a mãe finalmente disse:
*”Não vais ficar com ele.”*
Inês pestanejou. *”O quê?”*
*”Ouviste-me. Se achas que vais ficar aqui e arrastar o nome desta família pela lama—”*
*”Ela tem catorze anos,”* interrompeu o Ricardo. *”Tem de haver consequências.”*
Inês tentou falar, mas a voz falhou-lhe. No fundo, sabia que nada do que dissesse importaria.
Ao anoitecer, estava no alpendre. Sem gritos. Sem súplicas. Apenas uma mochila, fechada, com o que conseguira agarrar: dois pares de calças, três camisolas, o caderno de matemática e um frasco quase vazio de vitaminas pré-natais que comprara discretamente numa clínica local.
Pensou no seu único refúgio: a casa da melhor amiga, a Marta. Enviou uma mensagem, depois ligou. Sem resposta. Era noite de escola.
O estômago revirou-se—não só por causa das náuseas, que se tornaram constantes, mas pelo terror da realidade: não tinha para onde ir.
De braços cruzados, observou a vizinhança. Luzes quentes brilhavam nas casas, vidas normais a decorrer lá dentro. Atrás dela, a luz do alpendre apagou-se—sempre num temporizador. Era isso. Não voltaria.
Inês desistiu de tentar contactar a Marta. Os dedos estavam dormentes quando saiu para a noite, passando pelo jardim onde costumava encontrar-se com o Diogo, a biblioteca, onde pesquisara “sintomas de gravidez” pela primeira vez. Cada passo parecia mais pesado. Não chorou. Ainda não.
O abrigo municipal para jovens ficava a cinco quilómetros de distância. Lembrava-se de um cartaz na escola: “Refúgio seguro para jovens. Sem perguntas. Sem julgamentos.”
Quando lá chegou, os pés estavam cheios de bolhas e a cabeça leve. Um sinal sonoro ecoou na porta trancada. Uma mulher de cabelo grisalho curto apareceu, a examiná-la.
*”Nome?”*
*”Inês. Não tenho para onde ir.”*
Dentro, estava mais quente do que esperava—calmo, seguro. A Dona Luísa, a senhora na receção, entregou-lhe um cobertor, uma barra de cereais e um copo de água. Sem sermões. Sem ameaças. Inês comeu devagar, o estômago ainda inquieto.
Naquela noite, dormiu num beliche com outras duas raparigas: a Sara, de dezasseis anos, a estudar para o exame, e a Leonor, que mal falava. Não fizeram perguntas. Elas entendiam.
Na manhã seguinte, a Dona Luísa levou-a a um gabinete pequeno.
*”Estás segura aqui, Inês. Terás uma assistente social, cuidados médicos e apoio escolar. Não contactaremos os teus pais, a não ser que estejas em perigo.”*
Inês acenou.
*”E… sabemos que estás grávida. Também te ajudaremos com isso.”*
Pela primeira vez em horas, Inês sentiu o ar voltar aos pulmões.
Nas semanas seguintes, aprendeu o que era a autonomia. A assistente social, a Daniela, ajudou-a a marcar consultas pré-natais, a arranjar terapia e a inscrever-se numa escola alternativa para jovens grávidas.
Estudava sem parar. Não queria ser a rapariga que engravidou aos catorze; queria ser mais. Por si. Pelo bebé que crescia dentro dela.
No Natal, o Diogo finalmente enviou uma mensagem: *”Ouvi que saíste de casa. É verdade?”*
Inês olhou para o ecrã e apagou a mensagem. Ele sabia—mas não se importou o suficiente para aparecer.
Em março, a barriga arredondava-se. Usava calças de maternidade doadas pelo abrigo e lia todos os livros sobre parentalidade da biblioteca. O medo ainda a visitava à noite. Que tipo de mãe poderia ser aos catorze?
Mas momentos como ouvir o coração do bebé ou sentir a Leonor a repousar uma mão suave na sua barriga tornavam tudo suportável.
Em maio, apresentou um trabalho sobre estatísticas de gravidez na adolescência em Portugal à turma da escola alternativa. A voz era firme, os dados convincentes. Não parecia uma rapariga que perdera tudo; parecia alguém a construir algo novo.
Quando a filha, a Esperança, nasceu em julho, Inês estava rodeada não pelos pais, mas por quem escolheu cuidar dela: a Dona Luísa, a Daniela, a Sara, a Leonor—a sua nova família.
Tinha catorze anos. Ainda assustada. Ainda jovem. Mas já não estava sozinha.
Enquanto embalava a Esperança, com o sol de verão a entrar pela janela do hospital, Inês sussurrou suavemente:
*”Começamos daqui.”*





